Desde meados de março deste ano todos nós, moradores e trabalhadores da Cidade de Goiás, fomos inseridos na realidade global da pandemia causada pelo vírus Covid-19. A partir desse momento, todas as nossas dinâmicas sociais foram alteradas pela necessidade de nos recolhermos às nossas casas.
O cenário da pandemia só é comparável com outro, ocorrido há cem anos: o da gripe espanhola. Com alcance mundial em 1918, pode ter chegado a matar cerca de 100 milhões de pessoas em todo o mundo. No Brasil, seu impacto está registrados nas memórias de Nelson Rodrigues, publicadas em crônicas para o jornal:
Morrer na cama era um privilégio abusivo e aristocrático. O sujeito morria nos lugares mais impróprios, insuspeitados: – na varanda, na janela, na calçada, na esquina, no botequim. Normalmente, o agonizante põe-se a imaginar a reação dos parentes, amigos e desafetos. Na [gripe] Espanhola não havia reação nenhuma. Muitos caíam, rente ao meio-fio, com a cara enfiada no ralo. E ficavam, lá, estendidos, não como mortos, mas como bêbados. Ninguém os chorava, ninguém”. (Nelson Rodrigues, Correio da Manhã, 1967)
Goiás é uma cidade com um grande fluxo turístico ao longo do ano. Com a pandemia, as ruas ficaram vazias. O comércio, fechado, assim como as escolas, sem os gritos e brincadeiras de seus estudantes. Os tambores do Fogaréu não tocaram. Um grande silêncio nas ruas se estabeleceu, pesadamente, sobre as calçadas e ruas de pedra de Goiás.
Aos poucos, a cidade e seus habitantes foram criando novos ritmos para uma vida mais recolhida. É desse novo cotidiano que queremos tratar: através do registro da paisagem nas atividades mais simples: a ida às compras, o percurso para o trabalho. Esse olhar para uma cidade que não está vazia, mas reconfigurada.
Agradecemos a todos os membros do Museu de Arte Sacra da Boa Morte e do Museu das Bandeiras, que nesse momento tão delicado tem se dedicado diariamente para manter nossos museus seguros e vivos, sendo os olhos dedicados a ver nossa cidade nessa exposição.
Nesta exposição vocês poderão observar as mudanças no cotidiano da cidade de Goiás, pela ótica dos nossos colaboradores, estes que continuaram trabalhando em serviços essenciais como limpeza e segurança, e também pelas lentes do restante de toda equipe do Museu de Arte Sacra da Boa Morte e Museu das Bandeiras que estão em isolamento. Solicitamos a eles que no decorrer das suas rotinas, pudessem registrar as alterações de comportamento e até da paisagem no dia a dia de Vila Boa de Goyas. Uma nova dinâmica imposta pelo poder público para prevenir a contaminação da população pelo vírus COVID-19.
Lembrando que todos usaram seus próprios celulares para fotografar, portanto algumas fotos não estão com uma resolução tão boa, mas com certeza conseguiram retratar de uma forma bem natural e autoral.
Aproveitem!
A Rua Couto Magalhães com suas casas e lojas fechadas. Agora mostraremos uma sequência da Praça do Coreto rodeada por comércios, órgãos públicos, museus e pela Matriz de Sant’Ana. O Coreto sem seu famoso sorvete, difícil é escolher o sabor. A imponente Matriz San’tana, e ao seu lado esquerdo o Palácio Conde dos Arcos todos fechada e quieta, causando um saudosismo de quando seus sinos eram tocados para avisar a celebração de mais uma missa. (Praça do Coreto). Bancos vazios esperando uma boa conversa entre amiges. (Praça do Coreto) A noite chega sem o burburinho dos artesanatos, bares, restaurantes e sua clientela desfrutando do prazer bucólico de ver a vida passar. (Praça do Coreto) A noite chega sem o burburinho dos artesanatos, bares, restaurantes e sua clientela desfrutando do prazer bucólico de ver a vida passar. (Praça do Coreto)
Desinfestação de algumas ruas da cidade. Todas as segundas, quartas e sextas-feiras, no horário das 07h às 09h. (Rua Luis do Couto)
Regra até para fazer uma “fezinha”. (Rotatória da rua Santos Dumont) Adultos e crianças se adaptando a uma nova rotina. (Supermercado próximo à Praça Jornalista Dr. Goiás do Couto, na Rod. Federal, bairro João Francisco). Adultos e crianças se adaptando a uma nova rotina. (Supermercado próximo à Praça Jornalista Dr. Goiás do Couto, na Rod. Federal, bairro João Francisco) Disponibilização do álcool em gel nos comércios. (Casa de materiais de construção, na Praça Dr. Goiás do Couto, da Rod Federal, bairro João Francisco) Como manter a distância de segurança se é difícil escutar o que a outra pessoa diz? (Casa de materiais de construção, na Praça Dr. Goiás do Couto, da Rod Federal, bairro João Francisco)
Nossa colaboradora da equipe de segurança a caminho do MUBAN, ao lado direito percebemos a Escola de Arte Plásticas Veiga Valle com suas portas fechadas. (Avenida Hermógenes Coelho)
O colaborador Saulo retrata a falta, mesmo que de longe, das conversas e risadas dos alunos da Unidade Acadêmica Especial de Ciências Humanas (UAECH), localizada na Praça Brasil Ramos Caiado, no antigo Colégio Sant’ana. Ahh, que saudade! Cadê os guias de turismo e excursões subindo por essas ladeiras? (Praça Brasil Ramos Caiado)
Na rua Professor Alcides Jubé entrada e saída dos alunos professores empolgados para mais um dia de aula no CEPI- Professor Alcides Jubé. Aulas agora só online. Na rua Professor Alcides Jubé entrada e saída dos alunos professores empolgados para mais um dia de aula no CEPI- Professor Alcides Jubé. Aulas agora só online. A casa do governador também fechou suas portas e janelas. (Palácio Conde dos Arcos, Praça do Coreto.
Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro) Ruas importantes do centro histórico que tinha um grande fluxo de pessoas, por conta do agitado comércio que possuem. Nestes dias de pandemia se entristeceram e ficaram mais quietas. (Rua Americano do Brasil, Rua Professor Ferreira e Rua 15 de Novembro)
O senhor espera algo? Será que na esperança de comer uma comidinha caseira no Rosa de Saron? Comer em casa virou a regra. (Avenida Dário de Paiva) E esse restaurante que sua inauguração nem ocorreu. (Rua Padre Luís Gonzaga, Praça de Eventos). Dar uma olhadinha sem compromisso já não é tão simples. (Rua Santos Dumont) Exigências até na hora de se medicar. (Avenida Sebastião Fleury Curado) Dando o exemplo. O prédio, construído em 1911 e recém restaurado que se instalam o Poder Executivo e do o Centro de Atendimento ao Turista continua com suas portas fechadas. E o senhor Silas todo contente por seguir todas as recomendações. Parabéns. (Rua Santos Dumont) Vamos fazer umas compras? Sim, um de cada vez. Está fechado? Não, só pela lateral. (Rua Dário de Paiva) Bater um papo com atendente. É! Com a máscara fica bem difícil. Fala mais alto por favor. (Rua Dário de Paiva) O Museu Casa de Cora Coralina ficou quieto, mas para depois voltar melhor e saudável. Para finalizar, até nossa poeta e guardiã Cora Coralina está tomando o devido cuidado. Para ninguém esquecer de usar a sua máscara.
COVID
Maria perdeu o emprego. O patrão é milionário, mas disse que não poderia mais pagar o salário mínimo dela. Carla perdeu a mãe. Preferia ter perdido o emprego.
Cecília manteve o emprego, em home office. Só que a saúde mental não existe mais. Francisca acha que o vírus não existe e que a semente que o pastor vendeu vai curar qualquer maldição. Francisca tosse muito há 5 dias.
Gabriela trabalha em hospital. É médica. Chora todos os dias. Ou quer chorar, mesmo quando não chora. Vivencia uma ingrata realidade que vai de encontro ao negacionismo das inúmeras pessoas que vê correndo sorridentes no calçadão no seu caminho de volta do hospital.
Pedro não volta mais para casa. Prefere dormir na casa de um amigo que o acolheu. O medo de contaminar a família adoece Pedro aos poucos. Pedro entrega comida por aplicativo. Pedro ganha menos de 1000 reais por mês. Thais tem pesadelos todos os dias. Está desempregada desde antes da epidemia. Thais é uma excelente contadora. Thais não sabe como pagar o aluguel no próximo mês.
Marcelo ignorou a quarentena e continuou visitando os pais e avós aos finais de semana. Marcelo está isolado em casa, há 10 dias, com o pulmão totalmente comprometido, porém, sem nenhum sintoma. Marcelo perdeu seus avós há 4 dias para o Covid-19. O que restou de sua família está agora em quarentena total por ter tido contato com Marcelo nos finais de semana.
Josias furou o distanciamento e seguia com encontros sociais com amigos sempre que sentia entediado. Josias era portador do vírus e não sabia. Contaminou 3 amigos que, sem saberem, espalharam para mais 3 pessoas cada. Do total, 5 dos contaminados necessitaram de internação. O pai de um deles precisou de UTI.
Regiane, em plena adolescência, cobrava de todos que cumprissem a quarentena. Falava em responsabilidade e dizia que a regra valia para todos. Mas a exceção à regra só valia para seu namorado que ela recebia em casa todos finais de tarde. Sua avó diabética, que cumpria rigorosamente a quarentena, está com tosse e febre há 5 dias. Marta apanhou do marido depois de pedir para ele não ir para o bar. Marta é hipertensa e cardíaca. Marta trabalha com faxina. Marta pega 3 ônibus todos os dias. Marta perdeu o filho para a COVID19 há 10 dias.
Todas essas pessoas são reais. Todas têm nome, história, família.
Tudo que existe e existiu antes dessa pandemia… não será como antes. Nenhum de nós será como antes. Enfrentaremos juntos um luto que desconhecemos. Coletivo e individual ao mesmo tempo. Luto pelo emprego, pelo país, pelo pai, pela mãe, pelo irmão, pela amiga. Por tudo que perdemos. E todos perderemos algo ou alguém. Não será possível sermos os mesmos em um mundo que mudou.
Quem seguir vivo terá morrido um tanto. Quem seguir vivo terá assistido a partida de amigos, parentes e de pessoas a quem admirava mesmo sem ter conhecido. Quem seguir vivo, seguirá talvez sem emprego, talvez sem o carro, talvez sem uma parte de si, perdida… sem saber onde encontrar.
Não se iludam: só os indiferentes e os políticos sairão ilesos. Esses nunca perdem nada, nem ninguém. Não perdem por não terem e, se tem, não se importam quando supostamente perdem. Eles sempre vão tripudiar sobre você. É um dogma!
Luto é verbo e sentimento. Mais do que nunca. Pessoas mortas não giram a economia. É preciso estar vivo para seguir adiante e se recuperar de tudo isso.
Todos nós teremos que nascer de novo. E ser parido dói em quem está parindo e em quem está nascendo. Os olhos do recém-nascido se contraem diante da luz que nunca viram. O choro vem… a plenos pulmões. Fato é que choraremos.
E ao contrário do que podem pensar os incautos, esse não é um texto de desesperança. Que as pessoas nasçam de novo é, aliás, minha única e mais bonita esperança nesse momento.
Vã. Tola. Ingênua. Esperança.
Por Maria. Por Carla. Por Cecília. Por Francisca. Por Gabriela. Por Pedro. Por Thais. Por Marcelo. Por Josias. Por Regiane. Por Marta. Por respeito aos profissionais que estão lutando com suas vidas, sem ter outra escolha. Pelos milhares que já morreram. Pelos muitos que certamente irão morrer.
Por mim. Por você. Fiquem vivas (os).
Fiquem em CASA! E renasçam!!!
(Autoria desconhecida)
Ficha Técnica
Curadoria: Tatielle Brito Nepomuceno
SERVIDORAS (ES) DO MUSEU DAS BANDEIRAS, MUSEU DE ARTE SACRA DA BOA MORTE E MUSEU CASA DA PRINCESA
Etheila Oliveira; Ruth Vaz; Girlene Bulhões; Thélio Onofre; Renan Marquez; Tony Boita
COLABORADORAS (ES) DO MUSEU DAS BANDEIRAS E MUSEU DE ARTE SACRA DA BOA MORTE
Adrielle Gomes, Adriana Ribeiro, Djari Pereira, Maryna Lima, Luiz Otávio Pereira, Vando Rodrigues, João Chaves, Laura Batista, Saulo Daniel, André Avelino, Gizela Dias, Wariane Machado, Rodrigo Dias, Milena Tavares, Ruan Lucas Marciano, Waldim de Abreu, Cleimar Alves, Waldir de Souza, Valdimari Domingas, Euler José, Maria Anali Rodrigues.